David Brun escreveu:Marcussi, para vc não existe então um jeito de beber melhor? É tudo igual?
Não, passa longe de ser "tudo igual". Mas não sei se existe um "melhor" e um "pior", David. Para mim, há jeitos diferentes de se consumir cerveja, mas não sei se jeitos melhores e piores em absoluto. Diversidade não implica hierarquia - e para mim esse é o espírito de uma cultura cervejeira sadia.
Acho que o pessoal já pontuou bem que nem sempre quem bebe cervejas de vários estilos e mais caras bebe em menor quantidade do que aqueles que bebem American lagers industriais. Gastam mais dinheiro, sem dúvida, mas nem sempre bebem menos. Conheço muita gente que trinca o caco com cervejas caras e muita gente que bebe American lagers moderadamente. As situações são muito variadas para se generalizar, na minha opinião.
E digo que "beber melhor" e "beber pior" são avaliações extremamente subjetivas. Vou pegar o gancho do seu exemplo e falar sobre as últimas vezes em que bebi R$ 30 em Brahma e em Rochefort 10. Veja, trata-se de um exemplo extremo e retórico, pois a maioria das situações se situa num ponto intermediário. A última vez em que tomei um porre de Brahma, eu estava com os amigos da facu num snooker bar (que nem existe mais, por sinal) perto da faculdade numa sexta à noite. Era fim de semestre e a turma saiu para descontrair, jogar uma sinuca, comer alguma coisa e beber uma breja. Talvez tenha sido a última reunião dessa galera no bar, já no último ano da facu, e tenho excelentes memórias dessa noite. Já minha última Rochefort 10 foi bebida num final de tarde após um dia estressante de trabalho, acompanhando uma conversa bem mais curta antes de eu voltar para casa. Qual das duas situações foi mais significativa e positiva para mim e para a minha vida? Não tenho dúvida: o porre de Brahma. Vc poderá dizer: ah, mas foi a situação, e não a cerveja, que fez com que a noite fosse melhor. Exato. Mas a questão é: será que a mesma situação teria existido se tivéssemos bebido Rochefort 10 em vez de Brahma? Duvido muito.
Uma coisa é falar em cervejas de maior ou menor qualidade. Estou convencido de que uma Rochefort 10 é uma cerveja de maior qualidade em comparação com uma Brahma, e isso pode ser aferido por uma série de critérios objetivos, como concentrações de substâncias como ácido caprílico, dimetil-sulfeto, mercaptano e todas essas que um degustador sabe reconhecer objetivamente (sem precisar nem ler o rótulo). Mas não precisamos chegar tão longe: uma Eisenbahn Pilsen custa quase 10% da Rochefort 10 e também é uma cerveja com um padrão de qualidade objetivamente superior à Brahma. Ou seja, cervejas melhores e piores são um dado objetivo. Outra coisa, muito diferente, é falar em formas melhores ou piores de consumir cerveja, seja quais forem. Aí, nesse caso, acho que os critérios objetivos são enganosos.
Portanto, respondendo sucintamente à sua pergunta: acho que, salvo em situações patológicas (como o alcoolismo e compulsões semelhantes - que, de resto, podem também afetar os bebedores de cervejas caras), não existem formas intrinsecamente "melhores" ou "piores" de se consumir cerveja. Por isso acho prepotente a presunção de que nós devemos "ensinar" as pessoas a beber melhor. O que nós podemos fazer é mostrar um pouco do que existe para aquelas pessoas que, por si mesmas, chegaram à disposição de beber variedade e qualidade.