Gustavo Guedes escreveu: Sera que teria como existir algum cerva tipo lambic brasileira ou o 'terroir' nao daria pra reproduzir??
Obrigado, Gustavo. Pode existir lambic em qualquer canto do mundo, teoricamente. O que não daria para fazer é "clonar" uma lambic específica em outro lugar (do tipo, "quero que a minha lambic tenha exatamente o mesmo gosto da Girardin"), devido às diferenças na microflora nativa (que são, no fim das contas, o "terroir" das lambics). Nem os próprios belgas conseguem emular o perfil exato das outras cervejarias. O Jan van Roy, da Cantillon, costumava dizer que você não pode querer reproduzir as lambics já existentes; precisa aprender a adquirir um gosto pela lambic que o seu ambiente pode produzir. Nós temos como "modelo" as lambics bruxelenses, mas isso não quer dizer que os microorganismos selvagens nativos de outros lugares do mundo não possam produzir resultados diferentes, mas igualmente complexos, interessantes e deliciosos. Existem variedades de
Saccharomyces,
Pediococcus e
Brettanomyces em qualquer lugar do mundo, não só na Bélgica.
Além dos métodos tradicionais de "fermentação espontânea", hoje existem ainda laboratórios que fornecem um mix microbiológico que emula as espécies nativas de Bruxelas, e que pode ser inoculado no mosto para produzir um resultado teoricamente compatível com o de uma lambic belga, seguindo os mesmos procedimentos na fermentação, maturação e blendagem. A Wyeast e a White Labs possuem produtos assim. Eu mesmo já provei uma versão caseira de uma lambic com amoras que emulava bem o perfil de uma lambic jovem (estava com apenas um ano de maturação). É só questão de alguém se dispor a fazer algo assim. Há uma controvérsia se uma cerveja assim poderia ser chamada de lambic, já que ela não sofreu fermentação espontânea.
Nos EUA, as microcervejarias que produzem sour ales costumam usar essas cepas de laboratório em suas cervejas. Mas nem sempre seguem os longos períodos de maturação das lambics belgas, experimentando com procedimentos alternativos que têm dado resultados interessantes. No Brasil, ninguém ainda investiu pesado nisso, talvez por receio de contaminação das outras cervejas produzidas na mesma fábrica. Mas vamos ser realistas: se uma imperial stout comum pode chegar às prateleiras custando 60 mangos, quanto ia custar uma breja que precisa de 3 anos de maturação em madeira, como uma gueuze tradicional?