Esta Three Floyds / Mikkeller Hvedegoop vem listada como sendo do estilo Specialty-Beer, que caracteriza cervejas artesanais com algo que a torna especial, como por exemplo um tempero único. Pode incluir maltes e cereais pouco comuns, blend de cervejas, combinações de estilos, receitas turbinadas, enfim, algo que lhe confira distinção. A coloração é variável, podendo ser clara ou escura, e a formação da espuma poderá ser influenciada pelo adjunto/processo dito especial; o aroma é harmonioso, mas a ideia do estilo é de que sobressaia, de que seja saliente ou ao menos perceptível o que torna a cerveja especial; o sabor em regra segue o aroma e repete tais percepções, podendo proporcionar um corpo de leve a pesado.
Para ser mais preciso esta Three Floyds / Mikkeller Hvedegoop é uma Barleywine de trigo (wheatwine) em cuja receita foi usado aproximadamente 50% de malte deste cereal, além de malte de cevada e uma forte carga de lúpulos de variedades americanas de perfil cítrico e herbal (apollo e bravo). Hvedegoop significa algo como gosma/lodo de trigo em dinamarquês e é fruto da parceira entre as famosas e destacadas cervejarias Mikkeller, da Dinamarca, e a Three Floyds - americana. Creio que o nome tem algo a ver com a gravidade da cerveja e há outros rótulos do estilo na mesma toada (Majsgoop - milho; Boogoop - trigo sarraceno; Risgoop - arroz; Oatgoop - aveia e Ruggoop - centeio).
É produzida nas instalações da cervejaria americana Three Floyds, de Munster/Indiana, fundada em 1996 pelos irmãos Nick e Simon e o pai Mike Floyd. A 3F permaneceu alguns anos como a melhor cervejaria do mundo, eleita pelo Ratebeer, caindo para segunda colocação em 2008. Este rótulo foi produzido em parceria com a cervejaria Mikkeller, fundada em 2006 na cidade de Copenhage/Dinamarca por Mikkel Borg Bjergsø, um professor do ensino médio de matemática e física, e pelo jornalista Kristian Klarup Kellercujo. A produção das cervejas Mikkeller, exportada para mais de 40 países, se dá de forma nômade, utilizando as instalações de outras cervejarias o que acaba por divulgá-las e avalizá-las, além de economizar o dinheiro que corresponderia à montagem de instalações próprias. Há ainda bares Mikkeller em Copenhage, Estocolmo, San Francisco e Bangkok. O portfólio de ambas as cervejarias é vastíssimo, com cervejas especiais (brassagem única), sazonais, comemorativas e continuadas. Este é o primeiro rótulo 3F e o segundo Mikkeller que degusto, mas tenho na adega joias de ambas como Baller Stout, Dark Lord (original e o famosíssimo BBA), Mikkeller Beer Geek Brunch, Mikkeller X Imperial Stout, Mikkeller Black Hole e outros.
A garrafa é de 750ml (a versão feita nos EUA tem 660 ml), cor marrom, sem rolha, tampa prata, vintage 2012, validade: 06/09/2017. O rótulo se apresenta na cor azul, é muito bacana e criativo e traz em letras brancas e grandes o nome dado à cerveja, além das bandeiras da Dinamarca e dos EUA e entre elas uma caveira de olhos verdes com o clássico chapéu do Tio Sam (cartola). Figuram nas bandeiras as dezenas '76' (EUA) e '69' (Dinamarca) e logo abaixo lúpulos e ramos de trigo. No primeiro caso parece se referir ao ano de independência americana - 1776; já no caso da Noruega não encontrei referências históricas a tal data, além da suposta liberação da pornografia no país em 1969. Figuram ainda no rótulo a graduação alcoólica (ABV 10,4%), ingredientes, símbolos das cervejarias, validade etc.
Vertida na taça revelou um líquido de coloração alaranjada, medianamente turvo, espuma bege de bela formação e consistência, com bolhas médias e razoável manutenção. Apesar do ABV elevado algumas poucas rendas se formaram e ao girar a taça as paredes laterais do vidro ficam tomadas pelo líquido viscoso mais ou menos como bolinhas de sagu escorrendo - as tais 'lágrimas'. Perlage (bolhas) perceptível.
O aroma desta cerveja é bastante convidativo! Aromático e complexo nele pode-se perceber substanciosas notas maltadas com nuances de caramelo, pão integral, frutas secas (ameixas), tostado, trigo, pêssegos, pera e lúpulos com perfil cítrico (casca de laranja), herbal (pinheiros) e resinoso. O álcool é bem saliente, mas agradável.
No paladar o líquido se apresenta oleoso e reitera a complexidade exposta ao olfato, amplificando-a. De caráter inicialmente adocicado percebe-se na cerveja uma forte base maltada com nuances de caramelo, pão integral, frutas escuras (ameixas) e amarelas (pêssego), trigo, amadeirado e amargor cítrico (casca de laranja), herbal (pinheiro) e resinoso que amarra a boca. O final se mostra amargo e picante e o retrogosto é agridoce, alcoólico e persistente. O álcool de 10,4% ABV é potente e confere um agradável aquecimento na garganta, mas é bem inserido e ajuda a lavar a boca. O corpo é médio-alto e a carbonatação é média-baixa. A palatabilidade (drinkability) é muito boa e apesar da 'boca cheia' a cerveja foi fácil de beber.
Degustação altamente prazerosa, proporcionada por um conjunto complexo, encorpado e de equilíbrio tendendo ao amargor.