Os leitores mais velhos devem se recordar com nostalgia dos Rolinhos Pan, cuja embalagem está reproduzida aí em cima. Estampados na caixa, que imitava uma cigarreira, dois garotinhos sorridentes fazendo o clássico sinal de “joinha” com o polegar em riste. No conteúdo, barrinhas roliças de chocolate embrulhadas em papel com desenho de cigarros de verdade. Fizeram sucesso até o final dos anos 80.
Houve gente que disse que se tratava de uma conspiração pavloviana das indústrias de cigarros para arrebatar, já na infância, milhões de consumidores tabagistas, associando o cigarro à imagem de inocência e alegria das crianças. Eu mesmo, de calças curtas, adorava imitar o ato “adulto” de fumar com os Rolinhos Pan, sempre a mim presenteados, veja só, pela minha mãe.
Nos dias de hoje, após o apartheid antitabagista deflagrado pelos norte-americanos, se fossem colocados nas gôndolas dos supermercados, os Rolinhos Pan causariam comoção mundial. Da mesma forma, os antigos anúncios de cigarros na TV, tão elaborados e bacanas, foram banidos do ar e, se veiculados hoje, suscitariam gritaria generalizada.
Nessa esteira, é de se pensar se há, realmente, grande diferença entre o efeito que produzem os anúncios de cigarro e os de cerveja, estes não menos elaborados, com os Zecas Pagodinhos e garotas de biquíni tão típicos do estilo. O cigarro faz mal, disso ninguém mais duvida. O consumo imoderado de cerveja, em grande parte das situações, causa dependência, violência doméstica, homicídios fúteis nos bares da vida, sem falar dos 35 mil mortos no trânsito a cada ano. A propaganda de cerveja foi feita para estimular o consumo e glamurizar quem é um “bom bebedor”. A propaganda de cerveja é, nos dias de hoje, o que os Rolinhos Pan foram no passado.
O que faz com que a retirada de pauta, pelo Congresso, do projeto de lei governamental que restringia a propaganda de cerveja na TV, se torne um absoluto atraso. É bom que se diga que tal se deu em função do lobby das grandes cervejarias, associado à bancada dos parlamentares proprietários de retransmissoras de televisão, que se beneficiam com a enxurrada de dinheiro dos anúncios. Patifaria geral, como sempre.
Doutrinando as mentes mais incautas, o mesmo lobby veiculou em TV e jornais anúncios que diziam que se queria “proibir a publicidade de cerveja”, o que configurava um “ataque à liberdade de expressão”. Pura balela. A uma, porque não se queria proibir nada, mas tão-somente restringir os horários de veiculação dos anúncios. A duas, porque, com a restrição de horários, a informação seria transmitida do mesmo jeito, com teórica exceção às crianças e jovens, os quais, pela lei, lhes é proibido o consumo. Rolinhos Pan neles!
Na mesma ponta da questão estão os Torcedores de Rótulos, dos quais eu já falei neste post. Para a propaganda da cerveja ou do que quer que seja, não basta veicular a informação. Urge que o consumidor se torne um defensor da marca. Para tanto, associa-se a cerveja aos aspectos mais caros do inconsciente popular, como o patriotismo e a verdadeira alegria de viver. Nada mais “joinha”. Nada mais Rolinhos Pan.
À parte a questão da saúde pública, enquanto o lobby das grandes cervejarias vence, os Torcedores de Rótulos, na geral junto com o Zeca Pagodinho, urram de contentamento.
Rolinhos Pan pra todo mundo!
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EM TEMPO:
Lendo o artigo, o amigo orkutiano Saulo Kico me enviou o link da embalagem anterior dos Rolinhos Pan, quando o produto se chamava Cigarrinhos Pan. Sim, “cigarrinhos”, sem rodeios, como demonstra a imagem abaixo. E com o garotinho “fumando” um deles. Posteriormente, a Pan alterou o nome e o rótulo do produto, talvez para amenizar a apologia.
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