Muita gente torce o nariz a elas, argumentando que as cervejas que as contém ficam com “gosto de ferrugem”. Pra piorar, uma parcela da cultura cervejeira mais popularizada ainda nutre clara predileção às chamadas “cervejas de garrafa”. De toda forma, é inútil espernear: As cervejas “de latinha” vieram pra ficar, e vêm ganhando cada vez mais terreno também no mercado das cervejas artesanais.
Estive na semana passada mais uma vez nos Estados Unidos, país que mais produz boas cervejarias artesanais no planeta e ponta-de-lança no que se refere a inovações do segmento cervejeiro. Em visitas a lojas especializadas em cervejas artesanais, surpreendeu-me a cada vez mais extensa e crescente disponibilidade de belos rótulos envasados nas prosaicas latinhas — e olhem que estive por lá em novembro do ano passado.
A tendência é compreensível quando nos deparamos com a facilidade de recursos técnicos disponíveis no país, aliada a um certo desapego ao sentimento tradicionalista cervejeiro europeu, para o qual cervejas em lata são encaradas como populares e de baixa qualidade (embora esse paradigma também venha mudando, a exemplo da cervejaria artesanal escocesa BrewDog, que apresenta seus rótulos em ambas as formas de envase).
Cerveja com cheiro de gambá
Embora os degustadores mais apegados às tradições possam fazer cara de desconfiança, é certo que as cervejas envasadas em latas possem pelo menos uma clara e indiscutível vantagem em relação às brejas em garrafa. Conhecido com o árido nome químico de 3-metil-2-butano-1-thiol, o defeito cervejeiro identificado pelos iniciados como lightstruck ocorre quando a cerveja já envasada permanece sob exposição à luz, seja natural ou artificial, razão pela qual a maioria das garrafas é de coloração âmbar, a fim de minimizar sua ocorrência. Os especialistas em degustação relacionam o defeito ao cheiro de gambá, e algumas cervejas populares cujas garrafas são transparentes adotam o marketing de estímulo a serem servidas com uma rodela de limão no gargalo justamente para disfarçá-lo.
Já se envasadas em latas, sejam quais forem suas qualidades, as cervejas ao menos ficam livres do lightstruck. Mas e com relação ao alegado gosto de ferrugem que alguns bebedores sentem quando degustam uma breja de latinha? Em 2008, BREJAS ouviu um renomado especialista no assunto, o qual garante que, se há diferenças de aroma e sabor entre os envasamentos, a culpa não é do material (veja aqui essa polêmica matéria). Quanto a mim, já experimentei diversos rótulos de cervejas artesanais nas latinhas, e não senti alterações significativas.
E no Brasil?
As cervejarias artesanais brasileiras certamente seriam bastante favoráveis às latinhas caso esse tipo de envase fosse mais barato por aqui. Além de outras vantagens, as latas são infinitamente mais práticas no transporte e manuseio, uma vez que não se quebram como as garrafas de vidro.
Todavia, em terras patropis ainda temos que conviver com o chamado “custo Brasil”. Tudo, absolutamente tudo por aqui é muito mais caro que lá, incluindo equipamentos e peças apropriadas de envase, fazendo com que a vantagem seja um privilégio reservado quase que exclusivamente às grandes cervejarias. Muito ainda temos de avançar — incluindo no campo governamental para incentivos em compra de equipamentos para as pequenas cervejarias — até que mais essa face do nosso atraso, enfim, seja superada.
Mas e você, leitor, de que forma encararia uma breja artesanal brasileira se a encontrasse na latinha? Opine!
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