LAMBICS: Da ojeriza à genuflexão

(Nota introdutória do BREJAS – Se você ainda não conhece o estilo Lambic, recomendamos que você clique AQUI para entender a definição desta variedade de cervejas.)

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Há muito tempo hesito em escrever um artigo sobre as cervejas do estilo Lambic. Isso porque, desde que nos interessamos pelo assunto cervejeiro, jamais encontramos entre os degustadores um consenso minimamente pacífico. Em geral, o estilo parece seguir o conselho bíblico da Carta de Laudicéia: “Seja quente ou seja frio, não seja morno que eu te vomito”. Em miúdos, ame-a ou odeie-a.Talvez nossa primeira esperiência com as Lambics se deu através da Chapeau Banana, uma belga da cervejaria De Troch. Trata-se do sub-estilo que se convencionou denominar de Fruit Lambic, aroma marcante – de banana, ora pois! – bastante docinha, very drinkable, apesar de apresentar leve amargor e azedo no final um tantinho salgado. De cara adoramos o estilo por acharmos marcante pelo que se propunha, mesmo com a característica ausência de creme. Depois da Chapeau Banana, vieram outras Fruit Lambics, Gueuzes e Faros, a maioria delas razoavelmente bem colocada no nosso Ranking.

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A brincadeira estava interessante até que, dia desses, BREJAS decidiu investir em algumas Lambics “de verdade”, da Cantillon. Digo investir porque o preço dessas belgas não é de bolinho de bacalhau: Uma Cantillon Kriek, no Brasil, custa algo em torno de R$ 70,00.

O leitor precisava ver as caras dos Confrades brejeiros quando degustaram algumas delas juntos. O docinho e a drinkability das Fruit Lambics degustadas alhures foram substituídos por doses nocauteantes (nauseantes, para alguns de nós) de cítrico, azedo, salgado, ácido e seco. O aroma até que era interessante (notas de uva, maçã, acerola e madeira), mas cadê a cereja que deveria estar aqui?

Ano passado estive por alguns dias na Bélgica e me impingi um desafio: Iria ficar um dia inteiro a tomar exclusivamente Lambics. Nesse dia outonal, determinado, perambulei pelos bares de Brugge a experimentar o que me parecesse imperdível em matéria de fermentação espontânea. Provei das incensadas Hanssens Oude Kriek e 3 Fonteinen Oude Geuze a líquidos intragáveis feitos apenas para turistas, como a Mongozo Coconut e sua pretensão de ser uma cerveja “exótica”, cujo copo é um meio-coco.

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Sei que há “cervejólogos” (particularmente, não simpatizo com o termo cervejólogo…) que dizem gostar das Lambics, mesmo as mais azedas e avinagradas. Se o fazem apenas para não parecerem “out” no meio cervejeiro, jogando a breja na pia quando ninguém está olhando, jamais saberemos. Quanto a mim, tenho a humildade de reconhecer que, em linhas gerais, as Lambics ainda não me convenceram.

Mas, talvez, resida exatamente nesse “extremismo” o verdadeiro charme escondido em meio à salobra aridez das Lambics. É preferível o erro à omissão. O fracasso, ao tédio. O escândalo, ao vazio… Quem sabe não é isso e a gente — ainda — não percebeu?


Comments

12 responses to “LAMBICS: Da ojeriza à genuflexão”

  1. Meu querido Maurício e todos os confrades que nos visitam,
    Sou um daqueles que achou interessante as lambic que tomei, e foram poucas.
    A Chapeau Banana é um tesãozinho, verdadeira delícia.
    No extremo oposto, tem-se a Cantillon, que é esquisitíssima; e fui um dos dois que não fizeram caras quando a tomamos, lembra? Azeda e salgada, vê se pode.
    A galera tirava sarro dizendo que era tempero de salada : )
    Mas eu achei muito diferente, e não desgostei dela. Tem um estilo próprio, e assim são os vários gostos pelo mundo e em diferentes culturas.
    Descobri, depois, que a tomamos com temperaura acima da recomendada.
    As lambics azedas devem ser tomadas muito geladas, em torno de 2 graus, para neutralizar o azedume. Assim se tornam muito refrescantes.
    Lanço o desafio de tormarmos de novo, e ver o que acontece. Topas?
    Abraços a todos e ótimo final de semana : )

  2. Mauricio (BREJAS) Avatar
    Mauricio (BREJAS)

    Topo!!!

    Por sinal, há mais uma Cantillon na adega do BREJAS!

    Concordo totalmente com o Confrade Menke, e partilho as minhas impressões com as dele. Também fui daqueles que não desgostou da Cantillon.

    Mais uma chance a ela? Topadaço!

    Grande abraço.

  3. Diogo Avatar
    Diogo

    Oi gente, sei que esse não é o espaço pra isso, mas foi o único meio que encontrei de entrar em contato com vcs. Em primeiro lugar parabéns pelo site, é bem bacana e perfeito para os adoradores de cerveja. Bem, gostaria de perguntar a vcs se será realizado um ranking com chopps. Sei que é difícil, mas aposto que existem chopps maravilhosos espalhados pelo Brasil, a exemplo do que acontece aqui em Brasília.
    Não sou daqui, mas o stadt bier (acho que escreve assim) é muito bom. Seria legal um teste pra saber quão bom ele é frente a demais marcas. Grato pela atenção. Até mais.

  4. Mauricio (BREJAS) Avatar
    Mauricio (BREJAS)

    Diogo,

    A dificuldade em provar a imensa variedade de chopes do país é, obviamente, porque você é obrigado a degustá-los no local onde são fabricados.

    De qualquer forma, o nosso Ranking é separado também por envase. Ou seja, uma cerveja pode ter uma nota ruim em garrafa e boa “on tap”, e vice-versa.

    Grande abraço.

  5. Diogo,

    Alem disso, o chope, diferente da cerveja, varia muito de acordo com o equipamento do bar e a forma como e’ tirado, influenciando o produto. Ou seja, nao adianta provar o chope A e pronto. Tem que ser num lugar que comprovadamente serve um bom chope, e mesmo assim nao garante que em outro lugar ele nao seja ainda melhor.

    Resumindo, avaliar chope nao e’ tarefa simples, envolvendo outras variaveis que tornam a matrix bem maior.

    Abarcos,
    Ricardo

  6. Ricardo disse tudo!

    Até mais do que a própria marca do chope, a forma como ele é tirado influencia tudo.

    Experimente, por exemplo, tomar um chope no Original (SP) e depois outro em qualquer boteco de praia. Os dois são Brahma, mas os tiradores do Original são decanos na arte.

    Por isso, a impossibilidade de rankear marca de chope, e sim a casa onde ele é servido.

  7. Wagner Avatar
    Wagner

    Ao primeiro gole quando degustei a cerveja Belle Vue percebi um sabor de vinho, que é uma bebida que não gosto mas na sequencia foi surgindo um sabor levemente amargo para ácido, o que agrada bastante o meu paladar.
    A primeira impressão é de que é apenas uma cerveja docinha.
    O interessante nessa cerveja é quanto mais gelada, mais refrescante e saborosa ela se torna.
    Junto com a La Trape Blonde, Fuller´s Golden Pride, 8.6, Warsteiner, Licher e Konig Pilsener é uma das minhas prediletas.
    Abraços!

  8. Bem, eu fui avisado que não iria gostar das Cantillons de primeira. Mesmo assim, a primeira coisa que fiz depois de deixar a mochila no albergue em Bruxelas foi correr pra lá. Sábia decisão.

    Primeiro, porque a família Cantillon-Van Roy é sensacional e passear por dentro da cervejaria (mesmo que no período sem produção) é algo mágico. Segundo porque, bem,. eu gostei desde o primeiro gole.

    Eu tinha uma garrafa da gueuze em casa e não tinha aberto ainda porque ficou muito tempo em um supermercado do Rio e temia que pudesse estar ruim, queria então provar uma fresca antes. Quando contei isso para eles, virei a sensação do dia (eles não faziam idéia que seria possível comprar uma Cantillon em uma grande rede de mercados no Rio de Janeiro!) e os Van Roy, ao invés de me servirem apenas as duas provas que constam no pacote de entrada, me “embebedaram” com umas 5. Provei a Lambic, a Gueuze, a Kriek, uma Rosé de Gambrinus tirada direto do barril e, quando perguntei se rolava uma Faro, eles fizeram cara feia dizendo que não valia a pena provar porque era a “mais comercial” deles, que me dariam algo melhor. E deve ter sido, porque a Cuvée des Champions é sensacional.

    Gostei bastante também da Oude Gueuze da Hanssens, que foi dica do proprietário do Staminée de Garre. Provei essas mais comerciais, como a Chapeu Peche, Mort Subite, talvez não tantas quanto gostaria – além daquele troço esquisito chamado Mongozo Coconut. Prefiro as lambis mais “radicais” mesmo. Fazer o que, gosto de Brettanomyces. Tanto que achei a Roddenbach Grand Cru uma delícia e tenho a Santa Orval no meu coração 🙂

  9. Pedro,

    Esta sua narratória foi uma verdadeira tortura para mim. QUE INVEJA DE VOCÊ!
    Espero fazer esta viagem o mais rápido possível. E vou te pedir dicas, se você me permitir.
    Tenho uma Cantillon Lou Pepe Kriek 2002 aqui fechadinha esperando para ser degustada.

    Abraço.

  10. Rodrigo, se eu puder ajudar em algo, sinta-se a vontade 😉

  11. […] – Lambics: Da ojeriza à genuflexão. […]

  12. […] com IBU´s que vão de 60 a incríveis 120. Outras brejas possuem muito pouco amargor, como as lambics, cujo IBU é de, no máximo, […]

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