Experimentar a cerveja mais alcoólica do mundo já estava entre os meus objetivos desde antes de desembarcar em Nova York, na minha viagem cervejeira aos Estados Unidos. Reconheço que fui ao pote com mais desconfiança do que sede. Com nada menos do que 27% de teor alcoólico, eu esperava beber muito mais uma espécie de Bierlikör (o licor de cerveja da Eisenbahn, que apesar de ser feito com cerveja, é licor) do que uma breja propriamente dita.
A Samuel Adams Utopias, elaborada pela Boston Beer Company, leva ao paroxismo o conceito de cerveja extrema. Proibida em diversos estados americanos em razão da sua força alcoólica, a breja leva maltes alemães e tchecos, além de lúpulos das variedades Saaz, Hallertauer Mittelfrüh, Spalter e Tettnanger. É envelhecida em barris de carvalho por onde já repousaram uísques e conhaques. Só foi brassada em três oportunidades, nos anos de 2002, 2005 e 2007. A cada produção, somente 8 mil de suas lindas garrafas de cerâmica emulando um tanque de mostura foram postas à venda no mundo todo. O preço inicial sugerido é de 100 dólares a garrafa mas, com as brejas esgotadas, alguns colecionadores pedem 500.
Pois foi no incrível Downtown Bar, no Brooklyn, que enfim experimentei a danada, ofertada pelo Robert Ayoub, amante de cervejas e proprietário do bar que tem a maior carta de loiras, ruivas e morenas de Nova York (850 brejas, e crescendo). A garrafa da Utopias (safra 2005), antes de pousar na nossa mesa, foi pinçada dentre as bebidas “quentes” do pub. Daí, me lembrei que a cerveja deve ser servida em temperatura ambiente, por mais estranho que pareça aos nossos costumes cervejísticos. E o festival de excentricidades dessa cerveja estava apenas começando.
A Utopias, em bares que ainda a possuem — e são bem poucos — é servida tal qual uísque, ou seja, em doses. Cada dose de 1 onça (cerca de 30 mililitros, ou um fundinho de copo) custa, no Downtown, absurdos 25 dólares (ou 55 reais, na cotação de hoje). Deitada à taça, a breja impressiona pela ausência total de carbonatação. Simplesmente não há espuma. “É licor”, pensei, pela enésima vez. Até que aproximei do nariz o líquido cor de cobre radiante. Só então percebi a dimensão do meu preconceito.
Inicialmente o álcool se volatiza fortemente no aroma, em sugestões explosivas de conhaque, vinho do Porto e madeira de carvalho. Mas é na boca que a cerveja “explode” em notas pungentes de toffee, baunilha, frutas vermelhas, mais madeira de carvalho e… maltes e lúpulos! Ou seja, trata-se, efetivamente, de cerveja — e não licor. A Samuel Adams Utopias, creiam-me, é extremamente complexa e difícil de ser descrita em palavras. Só experimentando.
E, para os degustadores que, como eu, não se cansam de buscar as mais utópicas brejas, resta um alento. A cervejaria tem planos de lançar, ainda neste ano, uma nova safra da Utopias. A conferir.
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