* Nota do Editor: Este post é a “continuação” do artigo Para onde vão as ACervAs?, publicado neste espaço em 6/1. Nele, expus a minha visão acerca do futuro das associações de cervejeiros caseiros. Sucedeu-se, então, uma saudável, interessantíssima e edificante discussão no espaço de comentários do post que se estendeu pelas listas de mensagens de algumas ACervAs, Twitter e Facebook. Estou, como se diz, “triscando” de vontade de participar desse diálogo. Mas, como autor do artigo e editor deste espaço, apenas lanço as discussões, evitando ao máximo protagonizá-las. Sim pois, como bem observou o leitor Julio Cesar Machado Junior, “mais interessante que o texto é a discussão que se criou em torno dele”. Dito e feito! Vamos discutir!
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Por David Figueira *
Interessantíssimo este ponto de vista. Volta e meia este assunto surge nos encontros da Acerva Paulista. Temos as mais diversas opiniões dentro da nossa Associação, o que torna nosso ambiente muito rico em discussões.
Ainda vivemos num círculo muito pequeno de pessoas e é ilusão achar que o nosso “movimento” atinge todos só porque de quando em vez surge alguma notícia em alguma mídia. Isso implica em dizer que nosso movimento ainda está em crescimento e, portanto, é fraco, e qualquer deslize neste momento pode acarretar num arranhão de imagem irreparável.
Enquanto diretor da Acerva Paulista, sei da responsabilidade que é dirigir uma Associação desta, que está baseada em um hobby e, portanto, o principal motor que nos faz prosseguir é a paixão que é fazer cerveja em casa. Mas como difundir mais e mais esse hobby? Existem dezenas de caminhos que a maioria dos que estão lendo este texto sabem. Porém, alguns preferem ir para o caminho comercial. Isso é errado?
Não…eu não acho. Conheço muitos cervejeiros caseiros que viram neste caminho uma maneira de pagar as despesas do hobby (fazer cerveja em casa não é um hobby barato), claro que outros tantos não. Porém, devemos crucificar estes cervejeiros? Não, afinal propagam numa esfera maior a existência de outros tipos de cervejas criando assim um círculo de realimentação de todo o processo. Porém há um viés legal nisso…sabemos que esta atividade não é legal (comercialmente falando) portanto deste ponto de vista enquanto diretor da Acerva Paulista não posso apoiar irrestritamente esta atividade. Ou seja, entramos em um paradoxo. E agora, o que fazer?
É papel da ACervAs esta discussão comercial? Não , não é. O movimento ACervA foi criado para propagar a fabricação de cerveja enquanto hobby. Temos este ponto como cerne de nossos estatutos. As ACervAs são entidades sem fins lucrativos, cujo propósito único é propagar uma cultura da boa cerveja baseada em fabricação caseira de seus associados.
Por isso, a responsabilidade extrema na direção que damos na ACervA Paulista para não sair de sua proposta original. Não aceitamos como sócios cervejarias, entidades jurídicas. Reprimimos quem usa o nome da ACervA para fins pessoais e mais, não queremos atribuir selos de qualidade — pelo menos não por hora. Esta é uma responsabilidade muito grande e foge de nossos propósitos.
É fato notório que não existe uma união entre as ACervAs estaduais, o que acarreta de imediato um enfraquecimento deste movimento. Consequência direta desta falta de unidade é a abertura para que associações com intenções nitidamente comerciais e que se aproveitam do boom das cervejas artesanais surjam por aí, e usufruam de um status falso de associação forte, que não são.
Mas ainda não respondi ao paradoxo. E a resposta que me vem à cabeça é resumida em uma palavra: Cooperativa. Porque não seguir o exemplo dos fabricantes de cachaça? Porque não criamos uma cooperativa? Claro que isso demanda investimento, mas será muito menor que abrir uma cervejaria sozinho. De cara, o modelo das cachaças não seria aplicável porque ainda não temos legislação para tal. Mas montar uma “fabriqueta” comunitária seria uma excelente saída. Cada produtor com seu tanque e dividindo despesas comuns. Este é um sonho que tenho há tempos. Esta seria até uma saída para sufocar estas fábricas que se dizem artesanais e que proliferam por aí. Uma saída para driblar os altíssimos custos de implementação fabril…uma saída à brasileira, porém legal e inovadora nesta área.
Nos últimos 24 meses não vi surgir uma única fábrica de cerveja genuinamente comprometida com o movimento das Cervejas Artesanais. O que vi foi a proliferação de fábricas que tentam imitar cervejas de macrocervejarias e que só querem surfar nesta onda. Um texto-desabafo que escrevemos para o blog dos Lamas (nossa confraria cervejeira) retrata isso.
Ficam aqui minhas considerações pra reflexão. Pão e Cerveja!
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* David Figueira é diretor da ACervA Paulista.
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