Por Marcio Rossi, correspondente especial do BREJAS em Belo Horizonte (MG), que acabou de retornar de viagem pela Europa.
Desci do trem após 1:22 de viagem no rapidíssimo Paris-Bruxelas da companhia Thalys. Dia ensolarado, céu azul naquele começo de tarde primaveril. No hotel arremessei as malas quarto adentro e dei logo um jeito de ganhar a rua. Entrei no primeiro bar que se apresentou, a poucos passos dali em uma esquina charmosa, edifício clássico de tijolos vermelhos e arquitetura secular.
Começava ali minha jornada de degustações em solo belga, parte dela dedicada a verificar como marcas conhecidas se apresentavam na origem, parte à exploração de novos rótulos. A dificuldade era escolher. Ali é evidente a valorização da criatividade, resultando em uma diversidade ímpar de estilos e versões, diametralmente contrastante com as escolas cervejeiras saxônicas.
Surpreendeu-me a destacada importância das lambics no mercado belga. Nos supermercados, um setor inteiro apenas de fruit beers das mais variadas formas. Nos bares, sempre algumas bicas de chope reservadas a lambics. Foi assim que resolvi enfrentar uma cerejíssima Mort Subit na versão pressão e percebi que enquanto por aqui merecem pouca atenção, lá disputam com as consagradas blondies e trappistas a preferência belga. E falando em copos, que maravilha beber cada cerveja em sua taça, tulipa, cálice personalizado, puro charme.
Essa não seria minha única surpresa. Os preços das cervejas em supermercados comerciais eram de chorar; pra dar uma idéia, trappistas viajando entre 0.95 e 1.50 Euros, nesses extremos, especificamente, Westmalle no começo, Rochefort 10 no final. Nos bares, como é de esperar, saltam para 2.5 a 3.5 Euros, o que muito embora esteja longe de ser barato, entusiasma o brasileiro habituado a pagar 3 vezes mais nas lojas especializadas. Aquelas maravilhosas taças que são encontradas em torno dos R$ 40 aqui custam cerca de 6 euros lá. Enfim, também para o bolso, uma festa, ainda que tudo mais seja muito mais caro que o Brasil. No Hotel Ibis onde fiquei, para se ter uma idéia, diária de 120 Euros sem café da manhã.
Visitando o mitológico Delirium Cafe, novas revelações, uma confirmação de algo que já havia me chamado a atenção nas lojas. Depois de alguns reencontros com rótulos consagrados em sua versão chope, comecei a exploração. Um rótulo que havia me fisgado foi o primeiro, Chouffe Dobbelen IPA Tripel. O que esperar de uma miscigenação dessas? Aumente suas expectativas porque o resultado não é menos que espetacular! Não consegui me recordar de haver provado algo com tanta complexidade e tanto sabor, destacando sempre uma qualidade difícil de encontrar nos exagerados IBUs da nova escola americana: equilíbrio. A cerveja tinha aquela coisa adocicada, cítrica e especiarias da belga, com delicioso amargor que de forma alguma se sobrepunha, mas combinava-se maravilhosamente.
Daí, viajei por outros rótulos onde percebi a criatividade belga não deteve-se à tradição dos estilos locais e muitas das grandes marcas estão oferecendo versões mais lupuladas de suas cervejas. Não é diferente com a fenomenal Westvletern 8, Orval, Carolus Hopsinjoor e outras tantas que chegam a ostentar em rótulos dizeres e figuras que remetem a houblon/hop (lúpulo). Foi seguindo essa trilha que chegue a cerveja La Rulles, uma das tantas da nova escola belga, essa artesanal oferecia no Delirium seu delicioso chope de destacado amargor. De Bruxelas estiquei até a lindíssima Brugge onde a cerveja local, a Zot, me confirmava essa tendência de ousadia lupular, novamente com equilíbrio e maestria. Ali, no bar e restaurante Cambrinus, continuei minha jornada revendo preciosidades conhecidas e aprendendo mais sobre a efusiva escola belga.
Que destino a Bélgica. Um país desenvolvido com gente educada e atenciosa, cervejas maravilhosas, cidades de beleza cinematográfica e culinária deliciosa.
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